Indenização Samarco: Entrevista EXCLUSIVA dá detalhes processo e reparação

Indenização Samarco – Perto de completar oito anos de uma tragédia ambiental sem precedentes no Brasil, milhares de pessoas que foram atingidas diretamente pelos estragos causados pelo rompimento de uma barragem de rejeitos de mineração na cidade mineira de Mariana, ainda buscam a devida justiça.

A indenização da Samarco se refere a um processo de compensação financeira e reparação de danos relacionados ao desastre ambiental, ocorrido em novembro de 2015.

Na ocasião, o rompimento da barragem resultou na liberação de uma enorme quantidade de lama tóxica que, por sua vez, causou danos ambientais significativos e resultou na perda de 19 vidas humanas.

Após o desastre, foram iniciados processos legais e acordos para garantir que a Samarco e suas controladoras compensassem as vítimas, reabilitassem as áreas afetadas e reparassem os danos ambientais.

Indenização da Samarco: entendendo a situação atual do caso

Os processos envolvem ações judiciais, negociações com governos e acordos com as partes afetadas. Isso inclui, portanto, comunidades locais, pescadores e autoridades ambientais.

Há repercussão, inclusive, no Reino Unido. O que tem sido chamado de “Caso Inglaterra“.

Porém os principais pontos seguem travados.

Por se tratar de um tema extremamente sensível, complexo e que mexe com a realidade de milhares de famílias, nós do Guia do Ex-Negativado consultamos o advogado Victor de Miranda Fonseca Viana, inscrito na OAB/MG 148908.

Ele conhece de perto o andamento do processo, possuindo clientes que buscam devida reparação.

Confira abaixo todas as perguntas e respostas da entrevista exclusiva:

Guia do Ex-Negativado: Como funciona o processo de indenização para as vítimas do desastre da Samarco?

Victor de Miranda Fonseca Viana: “Eu me permito não dizer desastre, porque desastre, segundo o dicionário, tem uma significação muito própria, e as palavras, elas devem ser utilizadas nas suas acepções, nos seus significados peculiares, porque senão a gente comete situações de equívoco. Então, eu me permito dizer não desastre, eu me permito dizer ilícito, prática de algo ilícito, ato ilícito que é o ato contrário à lei. Então, é assim que eu me refiro ao rompimento das barragens, que foram atos ilícitos contrários à lei. Desastre, segundo o dicionário, é o que causa, decorre de uma fatalidade, de uma catástrofe, é qualquer circunstância, evento, acontecimento que pode provocar um prejuízo imenso e grande prejuízo.

Então, aquilo ali, com todo o respeito a quem pense e sugira o contrário, não foi um desastre, foi algo provocado, porque decorre, segundo as informações que foram apuradas, de uma ingerência, de uma negligência, de uma imprudência. Então, já começa este o caminho”.

Guia do Ex-Negativado: Quais tipos de compensações são geralmente oferecidos?

Victor de Miranda Fonseca Viana: “As compensações são diversas, porque, como eu disse, nós temos um evento ilícito que ocorreu no ano de 2015, em novembro de 2015, rompimento da barragem, gerenciada, utilizada, de modo direto e indireto, pela Samarco, pela Vale e pela BHP.

As três empresas se beneficiavam dessas barragens de modo direto e indireto. E as compensações, elas comportaram requerimentos, postulações na justiça e administrativamente, extrajudicialmente. Após o rompimento das barragens, ocorreu a criação de uma fundação, que é a Fundação Renova, que, dentre outros objetivos, foi criada para gerenciar e reparar as vítimas deste evento ilícito, deste ato ilícito que decorreu as consequências do rompimento da barragem”.

Guia do Ex-Negativado: Qual é o papel da Fundação Renova no processo de indenização e reparação?

Victor de Miranda Fonseca Viana: A Fundação Renova tem programas que foram idealizados para reparar, só que até mesmo a Fundação Renova cria dificuldades. Ela cria fatores de limitação que dificultam que as vítimas do evento ilícito sejam, efetivamente, reparadas. Então, nós tivemos no momento, por exemplo, as pessoas que se sentiram lesadas em algum prejuízo, elas recorreram à justiça, tanto no Estado de Minas Gerais, quanto no Espírito Santo, porque as ações individuais, elas são buscadas na justiça estadual, na sede do domicílio da pessoa, ou na capital do Estado, onde as empresas têm sede.

Isso é regramento da legislação processual civil, do nosso Código de Processo Civil, do nosso CPC. Então, nós temos vias judiciais e extrajudiciais para buscar as reparações.

E a Fundação Renova, enquanto fundação criada para reparar, tem programas para gerenciar e fazer as devidas reparações.

Por exemplo, o Programa de Indenização Mediada, o PIN, que foi um programa criado para que as pessoas que tinham determinados pré-requisitos buscassem a Fundação e fossem reparadas. Isso independentemente de ação na justiça. Isso era extrajudicialmente. E ainda temos as ações na justiça. Este é um ponto.

E temos, além das ações individuais, as ações de jurisdição coletiva, que o Superior Tribunal de Justiça, STJ, localizado em Brasília, decidiu que, como estamos tratando de um rompimento de barragem que teve efeitos interestaduais – porque o rejeito de lama saiu de Minas Gerais e foi até o mar, no estado do Espírito Santo, cortando rios -, o STJ decidiu que as ações da jurisdição coletiva seriam julgadas, apreciadas, analisadas, processadas no âmbito da Justiça Federal em Belo Horizonte. Então é uma outra frente.

Guia do Ex-Negativado: Dê detalhes sobre os tipos de compensações que a Samarco é obrigada a pagar.

Victor de Miranda Fonseca Viana: Podemos falar em três hipóteses de tipos de compensações. As ações individuais, as ações coletivas e a busca extrajudicial, independentemente da justiça, diretamente na Fundação Renova.

Aí o segundo item: Quais são os direitos legais das comunidades afetadas e das famílias vítimas nesse caso? Os direitos legais são as reparações, as indenizações decorrentes, de modo direto ou indireto, dos rejeitos da barragem, dos rejeitos de mineração. Então, são as reparações pelos danos morais e danos materiais.

Exemplos de danos morais: Os transtornos, as aflições, as angústias, os danos na perspectiva existencial de planejamento, de programação familiar que as pessoas foram lesadas. Danos decorrente do desabastecimento de água. Tivemos municípios que captavam água do Rio Doce, que é o rio de maior extensão que recebeu rejeitos do rompimento da barragem.

Então, tínhamos municípios em que os habitantes, os munícipes dessas localidades, por exemplo, Governador Valadares (MG), ficaram sem água. E por ficarem sem água, que é um elemento essencial para a dessedentação humana – inclusive classificada como direito humano fundamental pelos programas da Organização Mundial da Saúde, também classificado pela ONU, Organização Nacional das Nações Unidas. Ficar sem água viola um direito fundamental, um direito humano fundamental. E as pessoas que ficaram sem água, em razão da impossibilidade de captação de água, essas pessoas têm direito ao que foi denominado dano água, têm os denominados danos categorias, que são as pessoas que de modo direto ou indireto retiravam o seu sustento, a sua subsistência do Rio Doce, ou de localidades em que foram atingidas, em que o rejeito impossibilitou a prática da atividade profissional. Aí temos essas hipóteses, então, de direitos legais das comunidades afetadas e das famílias vítimas”.

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Indenização Samarco – processo é complexo e demorado (Foto: Antônio Cruz / Agência Brasil)

Guia do Ex-Negativado: Quais foram os desdobramentos mais recentes no processo relacionado ao desastre da Samarco?

Victor de Miranda Fonseca Viana: Os desdobramentos mais recentes que tivemos foi o encerramento do programa Novel.

O programa buscou contemplar as pessoas que foram vitimadas, que tiveram perdas de renda, que tiveram desabastecimento de água, na hipótese do dano água, na hipótese do dano categoria, que é o que eu informei, a perda de renda, a perda de subsistência em razão do rompimento da barragem.

Esse Novel, ele foi um programa criado após uma condenação, uma imposição judicial da Justiça Federal em Belo Horizonte, antiga 12ª Vara Federal, hoje 4ª Vara Federal em Belo Horizonte, Minas Gerais, e que o desdobramento foi o encerramento desse programa, para que os indivíduos afetados que cumprissem determinados requisitos estabelecidos na lei, teriam direito a reparações pecuniárias, indenização em valor. Esse é um dos desdobramentos mais recentes.

E também temos, no âmbito das ações coletivas, também em Belo Horizonte, o Ministério Público Federal e as instituições de Justiça, e quando eu digo instituições de Justiça, são instituições auxiliares da Justiça, Ministério Público Federal, Ministério Público dos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais e do Espírito Santo e Defensoria Pública da União, conjuntamente fizeram uma solicitação em uma das ações civis públicas, para que o juiz da Quarta Vara Federal, em Belo Horizonte, analise e, se entender preenchido os requisitos, condene as empresas a reparar todos os indivíduos atingidos no que a gente chama de direitos individuais homogêneos para a população, que por qualquer razão, quaisquer razões, até hoje não foram reparadas, não foram indenizadas.

Essa população, então, tem a possibilidade de ser indenizada, isso no âmbito das ações aqui no Brasil. E por que eu digo ações aqui no Brasil? Porque temos também, em paralelo, uma ação tramitando um processo que é muito falado na mídia, que tramita, que tem encaminhamento na jurisdição da Inglaterra, na jurisdição inglesa, na corte britânica, também buscando reparar as pessoas vítimas do rompimento da barragem. Então, esses são, podemos dizer, três pontos de desdobramentos mais recentes. 

Guia do Ex-Negativado: Em sua visão, quais as medidas legais que as empresas podem tomar para evitar o que aconteceu?

Victor de Miranda Fonseca Viana: “Então, primeiramente, fazer estudos ou análises preventivos, tratar como o direito ambiental dispõe com os princípios da proteção, da precaução, da prevenção. A nossa legislação, ela é muito evoluída no âmbito de referência mundial, mas, infelizmente, não basta ter a legislação. Ela tem de ser cumprida, ela tem de ser exigida, tem de haver efetiva fiscalização pelos órgãos, pela sociedade, pelas autoridades. Então, o princípio da prevenção e da proteção e da precaução, que eu digo aqui como destaque, que pode ser medidas legais. É o cumprimento da legislação e não o esvaziamento, e não o enfraquecimento, como muitos setores pretendem fazer aí, flexibilizando, facilitando o processo de licenciamento ambiental.

Tramita no nosso Congresso Nacional vários projetos de lei para relativizar, para enfraquecer o licenciamento ambiental. E o licenciamento ambiental, ele é um procedimento necessário, imprescindível, inafastável, para que faça um empreendimento que possa ter qualquer espécie de impacto ambiental, como o próprio nome fala, licenciamento ambiental.

E as barragens de mineração, elas não fogem a essa necessidade, mas tem projetos de lei tramitando na Câmara dos Deputados e no Senado Federal para tentar relativizar, esvaziar, facilitar isso. Então, acredito que a resposta é o cumprimento da lei, e não o enfraquecimento e esvaziamento ou a facilitação”.

Guia do Ex-Negativado: E como os clientes do senhor têm visto a possibilidade de buscarem reparação?

Victor de Miranda Fonseca Viana: Olha, aqueles que foram efetivamente reparados, com certeza eles ficam nitidamente satisfeitos, porque veem a concretização de um anseio, de uma espera que data aí desde o ano de 2015, quando tivemos os direitos lesados, violados.

E aqui eu digo fomos, incluindo a mim, porque como habitante, como munícipe de localidade em que foi direta e indiretamente atingida (reside em Governador Valadares-MG).

Então, tem aquela sensação ainda de prestígio à justiça.

Por mais que tenha uma reparação demorada e num valor que se a gente for ver, dividir pelo período de espera, não é satisfatório, não é razoável.

Mas eu digo satisfatório e razoável, não que a gente queira prezar para que as partes se enriqueçam às custas dessas indenizações, não é isso. Não é essa a ideia que deve ter a pessoa. Mas que as empresas sejam punidas num contexto que a gente fala no universo jurídico, “com os danos punitivos”, que é para servir de exemplo, de caráter pedagógico, para evitar que situações idênticas aconteçam.

Lamentavelmente a gente teve quase que em sequência rompimentos de barragens, ambas de modo direto ou indireto, administradas, gerenciadas pela Vale, pela BHP, que são empresas que juntamente com a Samarco, gerenciam esses locais de mineração e recebem lucros exorbitantes, lucros que a gente não consegue sequer cogitar. E ao custo, ao preço de vidas alheias, de destruições de planejamentos familiares alheios, de mazelas, sequelas alheias.

Então essa é a questão central, a reparação e a sensação de crédito para a justiça. Porque justiça tardia, já nos é dito, não é justiça, senão injustiça. Isso foi dito por Rui Barbosa, um grande expoente do direito, e que a gente faz eco ao que ele já disse outrora.

Justiça tardia não significa concretização de justiça, porque assim como algumas pessoas são reparadas, tantas outras morreram aguardando a reparação. Então isso é que é o contexto de a gente ter reparação em valor adequado, em valor razoável, que cause desestímulo, que cause no ofensor, no agressor, na empresa poluidora, que cause uma sensação de buscar corrigir os rumos.

O que é a empresa Samarco

A Samarco é uma joint venture entre as empresas brasileiras Vale e BHP Billiton (50% das ações para cada uma), que ficou amplamente conhecida devido ao desastre ambiental ocorrido em 2015.

A empresa foi iniciada em 1971 por meio de uma união entre outras duas mineradoras: Marcona Corporation e S/A Mineração Trindade, e já tinha nome solidificado no mercado.

Com a tragédia de Marina, a organização foi uma das responsabilizadas pelo desastre, que gerou destruição de comunidades e na poluição de importantes rios da região, como o rio Doce.

Investigações e decisões judiciais afirmaram ter havido negligência e má gestão das barragens envolvidas.

Desse modo, a empresa foi obrigada a pagar multas e indenizações significativas às vítimas e ao meio ambiente afetado – mas o processo de pagamentos indenizatórios está longe de um fim.

Isso inclui compensações financeiras para as famílias das vítimas e para aqueles que perderam suas casas e meios de subsistência.

Além das indenizações, a Samarco foi obrigada pela Justiça a compensar financeiramente municípios afetados com os impactos infraestrutura, serviços públicos e perda de arrecadação de impostos, e a financiar projetos de reparação ambiental nas áreas afetadas, incluindo a recuperação dos ecossistemas danificados e a descontaminação dos rios poluídos pelos rejeitos de mineração.

A Samarco ainda atua na mineração?

Sim. Em seu site oficial (samarco.com), a empresa se posiciona da seguinte forma:

“Com os aprendizados adquiridos, promovemos as mudanças necessárias para escrever uma nova história e reconstruir as relações de confiança com a sociedade. Voltamos a operar de uma maneira diferente, com novas tecnologias e mais segurança, buscando sempre gerar valor duradouro para os territórios onde atuamos”.

A Samarco recebeu aprovação em outubro de 2019 da Licença de Operação Corretiva (LOC) que permitiu o retorno das atividades – o que já ocorre desde 2020.

Segundo também publica a empresa, é afirmado que desde a volta às operações, vem realizando uma retomada gradual com 26% da sua capacidade produtiva.

Caso Inglaterra: como está o processo inglês da Samarco?

Além de decisões judiciais brasileiras já terem definido a Samarco como culpada, existem também sanções na justiça inglesa, que é quem julga a responsabilidade de BHP – uma das donas da Samarco.

Popularmente já é chamado de “Caso Inglaterra”. 

Em junho de 2023, a BHP já sofreu uma derrota por tentar impedir uma ação judicial movida pela Pogust Goodhead e que foi deferida pela Suprema Corte do Reino Unido, após uma ação coletiva histórica com 700 mil pessoas.

Dessa forma, a gigante australiana da mineração enfrentará um novo julgamento em outubro de 2024.

O caso Inglaterra pede indenização de R$ 230 bilhões para as vítimas do desastre de Mariana.

O escritório responsável pelo processo coletivo afirma que:

“Nós consideramos que a BHP não conseguiu fornecer uma indenização justa por meio da Fundação Renova. Como os responsáveis seguem amplamente protegidos das consequências legais no Brasil, defendemos o direito de prosseguir com o caso na Inglaterra, onde a BHP era sediada na época do desastre”.

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